Ansiedade, estresse e crise econômica fazem aumentar a procura por tratamentos psiquiátricos
Medo de perder o emprego influencia quadro dos pacientes, diz psiquiatra. Cuidado com a saúde mental já não tem os tabus de antigamente
Terapias, tratamentos psiquiátricos e o cuidado com a saúde mental estão se tornando uma rotina cada vez mais comum entre os brasileiros. Sem os preconceitos que rondavam a área décadas atrás, as pessoas estão buscando auxílio médico especializado para resolver seus problemas com estresse e ansiedade.
Psiquiatra especializada em Neurociência, Karla Buccieri atende pacientes há 25 anos e tem reparado que os efeitos da crise econômica também estão influenciando a psique coletiva. “O medo de ser demitido, de ver o vizinho ou um colega ser mandado embora e temer pelo pior, ou mesmo de perder o padrão de vida conquistado pela família têm incomodado bastante meus pacientes. Isso acaba desencadeando quadros sérios de estresse”, afirma a médica cooperada da Unimed Curitiba.
Esses e outros aspectos a psiquiatra comenta na entrevista a seguir.
Como a saúde mental e os tratamentos psiquiátricos são vistos atualmente?
Muita coisa mudou, principalmente relacionado à Neurociência, que abriu os campos de estudo e a compreensão da Psiquiatria. Disso vieram as medicações modernas, que não têm mais tanto efeito colateral. Com isso, as pessoas começaram a se sentir mais a vontade para vir ao psiquiatra, sabendo que os métodos antigos – ficar dopado, amarrado ou algo do tipo – não existem mais.
Mesmo com as pessoas se sentindo mais a vontade, ainda há preconceito. Não deveria, já que psicofobia é crime, mas existe. Mas não chega a ser algo impeditivo como antes. Hoje as pessoas já sabem diferenciar um tratamento com psicólogo e com psiquiatra, além da questão dos remédios que receitamos. Sempre sugiro aos meus pacientes que façam o tratamento psiquiátrico, medicado, mas com terapia.
Muitas vezes o paciente baseia todo seu tratamento em cima de um remédio, e não é esse o objetivo: o ideal é que a pessoa consiga ficar independente e tenha muito cuidado com a medicação, já que os ansiolíticos (faixa preta) causam dependência.
Quais os perfis mais comuns de pacientes que buscam tratamento?
Dos meus pacientes, o perfil mais comum é a ansiedade, com um leque de fobias, pânicos, transtornos generalizados de ansiedade e assim por diante. Não podemos generalizar, lógico, mas a partir desses perfis mais comuns que começamos a investigar caso a caso para ser o mais assertivo possível.
Uma coisa curiosa do momento atual é que tem crescido a procura no meu consultório de pessoas com medo de serem demitidas, de não poder manter o padrão de vida. De tudo isso surge o stress, que é caracterizado por essa preocupação, tensão, a sensação de estar carregado, como se não houvesse um escape.
Como é o contato com a família do paciente?
Todo paciente com transtorno psiquiátrico deveria ter a família envolvida no tratamento, é o ideal. Muitas vezes o papel de cada membro da família é fundamental, principalmente na administração de medicamentos, se o paciente tem o perfil mais descuidado, ou mesmo corre risco de suicídio.
Existem diferenças no tratamento de jovens e crianças?
Atendo pacientes a partir de 16 anos, mas dá pra dizer que o tratamento psiquiátrico para crianças evoluiu bastante também. Há alguns anos, as crianças não eram diagnosticadas e sofriam sem saber. Hoje os pais estão mais atentos no comportamento da criança, se ela pode estar deprimida ou sofrendo bullying.
Os jovens na fase pré-vestibular também têm vários conflitos. Nessa fase, ainda são os pais que percebem as mudanças no comportamento e tomam a iniciativa de nos procurar. Os cuidados específicos que temos são em relação aos impulsos, às críticas, as paixões e tudo que se mistura na vida deles.
De que forma a Neurociência e a tecnologia contribuem nos tratamentos?
Sou especializada em Neurociência na Espanha. Acho que depois que os estudos da Psiquiatria evoluíram nessa área, tudo ficou mais fácil. Facilitou para o médico conseguir explicar melhor o diagnóstico para o paciente. Ter o desenho do cérebro em mãos concretiza melhor o que está acontecendo. Tira o estigma, a família não fica mais tão assustada com o diagnóstico.Além disso, a tecnologia tem trazido novas e boas possibilidades. O tratamento de Alzheimer, as influências do ambiente em que o paciente vive, entre outras, estão sendo desenvolvidos de forma promissora.