Vozes das Mulheres na Política: evento abordou desafios e a participação feminina nas esferas públicas
Com 100% das palestrantes mulheres, o evento reuniu mais de 200 pessoas, que conheceram um pouco mais da realidade feminina na política brasileira
Nos dias 17, 18 e 19 de abril, o Campus Juvevê da Universidade Federal do Paraná (UFPR) foi palco do evento Vozes das Mulheres na Política: Desafios da democracia em nível local e no Brasil, promovido pelo Instituto Sivis, em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) e Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP), ambos da Universidade Federal do Paraná (UFPR), RAPS e o Consulado dos Estados Unidos. Foram três dias de eventos, que reuniram mais de 200 pessoas, entre estudantes, pesquisadores e interessados pelo tema.
Cada um dos dias contou com mesas de debates, onde estiveram presentes palestrantes mulheres que abordaram temas relacionados à política, à democracia, aos direitos das mulheres e a sua participação na política. A coordenadora e professora do PPGCOM, Prof.Dra. Michele Goulart Massuchin, falou sobre a importância de realizar um evento com esse tema nos dias atuais. “Em outros momentos, talvez não seria necessário falar sobre as mulheres na política, mas hoje, no momento em que vivemos, é necessário porque ainda há poucas mulheres inseridas na esfera política, especialmente em cargos eletivos, e também porque muitas discussões não abrangem as questões de gênero".
A Prof. Dra. Amy Erica Smith, da Universidade de Iowa, nos Estados Unidos abriu o ciclo de palestras e abordou a democracia e as eleições fazendo um comparativo entre Estados Unidos e Brasil. Amy mostrou, por meio de pesquisas e gráficos, as tendências de votação, a crise da democracia nos países e opinou, de maneira otimista, sobre o futuro da democracia brasileira. Amy comentou sobre a pesquisa “Winners’ Consent? Citizen Commitment to Democracy when Illiberal Candidates Win Elections” em que os resultados reforçam que, para compreender o papel das eleições na manutenção da legitimidade das democracias, é importante considerar os compromissos democráticos tanto dos candidatos quanto dos eleitores. Para saber mais sobre essa pesquisa, acesse aqui.
Ao final de sua fala, que aconteceu virtualmente, a professora respondeu algumas perguntas referentes às eleições de 2018 no Brasil, e especificou algumas características citadas em sua análise, que trazem a faixa de renda, gênero, cor e escolarização como um fator que dividem os votos, não só na eleição analisada, mas em geral. Sua palestra pode ser conferida na íntegra pelo Youtube.
Identitarismo e violência de gênero
No segundo dia de evento (18), a primeira mesa abordou o tema "Ativismo, democracia e mulheres na esfera política", com três doutoras no assunto e todas da UFPR. A Dra. Kelly Prudencio discutiu conceitos importantes para uma compreensão mais alargada das mulheres na política. Entre os temas debatidos pela professora, mencionam-se, entre outros, os conceitos de lugar de fala e de identitarismo no mundo contemporâneo e as dinâmicas existentes entre a pesquisa científica e os movimentos sociais.
A composição da mesa ainda se deu com a Dra. Carla Rizotto, que trouxe um panorama do ativismo feminista contemporâneo na internet. “O digital não é mais um espaço de militância ou um lugar onde os feminismos acontecem, mas passou a ser uma dimensão constitutiva desse movimento. As agendas e as pautas não foram alteradas, porque elas permanecem muito semelhantes, mas mudando profundamente o alcance dos movimentos feministas, as estratégias de comunicação e a forma de agência política, ou seja, a forma que a gente endereça as demandas de política pública para resolver esses problemas que são elencados”.
Para fechar o ciclo da primeira mesa, a Dra. Giulia Fontes falou sobre a percepção de mulheres jornalistas sobre questões de gênero, de que forma isso constitui riscos para sua atividade profissional e como elas enxergam esses riscos. Também levantou as estratégias de resiliência que essas mulheres desenvolveram para, de alguma forma, enfrentar e lidar com os riscos da atividade profissional.
Giulia ainda apresentou dados referentes à deterioração da liberdade de imprensa e o aumento de ataques contra jornalistas, reunidos e divulgados pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas). De acordo com o relatório, que é publicado desde 1989, o ano de 2021 foi o ano mais violento contra jornalistas, com base em dados anexados pelos sindicatos de jornalistas e notícias de ataques.
Ainda no dia 18 de abril, a segunda mesa teve como tema “Democracia e plataformas digitais: da gestão à comunicação no setor público”, com a Dra. Maria Alejandra Nicolás (UNILA). A doutora e mestre em sociologia abordou a digitalização dos órgãos públicos e trouxe uma pesquisa, que mostra que o Brasil é o país com mais acessibilidade na América Latina e o Uruguai é o segundo, seguido de Colômbia, Chile e Paraguai.
Participação e desafios femininos na política
O terceiro e último dia de evento começou com a Profª Dra. Carla Almeida (UEM) discutindo o tema “Participação política, democracia e políticas públicas para mulheres". Carla fez um levantamento histórico do papel do movimento feminista na criação de políticas públicas para mulheres e a importância de órgãos como a Secretaria Especial de Políticas Públicas para Mulheres, fundamental para o combate à violência de gênero e a construção de políticas transversais. “Ainda que você tenha uma crítica, que permanece sobre o que o feminismo que apostou na institucionalidade foi capaz de produzir, eu acho que a ascensão das forças conservadoras renovou a energia da ocupação, sobretudo do parlamento. Foi lá que as demandas para o feminismo se acentuaram”, ressalta Carla.
A última mesa do evento foi sobre “Legislação Eleitoral e desafios para candidaturas femininas”, com a Profª Dra. Eneida Desiree Salgado e Profª Dra. Luciana Panke, ambas da UFPR. Desiree abriu a mesa falando sobre os desafios das mulheres na vida política. Ela destacou os preconceitos que a mulher sofre em uma sociedade que ainda a vê como figura responsável pelo cuidado e pelo ambiente doméstico, enquanto aos homens a vida pública não é discutida.
No âmbito político, Desiree afirmou que os partidos ainda não são espaços democratizados internamente e que as mulheres não têm espaço de fala igualitário. “Alguns gastos eleitorais não são previstos, e as candidaturas não podem pagar suas próprias despesas com hospedagem e alimentação, o que faz muita diferença caso você tenha recursos próprios. A gente não tem previsão ou possibilidade de gastos com cuidado infantil, com o dinheiro da campanha, ou seja, não pode pagar babá. Podemos pagar uma pessoa para balançar uma bandeira com nossa cara, mas não para cuidar das nossas crianças. Temos uma forma de gastos eleitorais que não é pensada para mulheres”.
Para fechar o ciclo, Luciana Panke apresentou dados de uma pesquisa sobre motivação de pessoas para não votarem em mulheres. De acordo com o que foi exposto, as respostas ficaram divididas em seis categorias: acreditar que há ausência de mulheres candidatas; acreditar que mulheres não têm preparo emocional; acreditar que lugar de mulher não é na política; considerar que mulheres são suas próprias inimigas, considerando que “nem mulher vota em mulher“; acreditar que mulheres não têm bons currículos - usam o discurso “voto pelo currículo, não é porque é mulher” -; e, por fim, considerar que política só é lugar para “algumas” mulheres. A Dra. também trouxe números comparativos sobre mulheres na política no Brasil e em outros países da América Latina, e expôs a importância de naturalizar o protagonismo feminino, e que ele seja trabalhado em todas as esferas.
Um relatório sobre o evento será divulgado nas redes sociais do Instituto Sivis nos próximos dias (@InstitutoSivis). Por enquanto, já pode-se acessar a palestra da prof. Dra. Amy Erica Smith pelo Youtube.
Sobre o Instituto Sivis
O Instituto Sivis, criado em 2011, é um think tank (laboratório de ideias e soluções) apartidário e sem fins lucrativos que trabalha pelo propósito de enraizar valores democráticos no coração dos brasileiros. O Sivis produz conhecimento e cria soluções junto a organizações, gestores públicos e lideranças sociais para fortalecer a cultura democrática brasileira. Acesse www.sivis.org.br.